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segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Emoções do vira-latinha Pitoco

– Pitoco! Passa! – a mãe de Pedrinho surgiu na varanda, apontando pra sua casinha. Ela ralhou porque Pedrinho estava, ó, até aqui, de deveres, e que não teria brincadeira, naquele dia. Então, Pitoco se foi pra casinha e daí ao portão e daí ninguém mais o viu. Oh, Deus! Roubaram o Pitoco. E agora?
Agora, feche os olhos para o coração ver Pitoco à carroceria de uma picape, embaraçado numa rede. Há um homem de cara ruim com ele, e Pitoco se apoia à tampa, olhando a tudo que passa até chegar à nova morada.
   Pitoco não sabia o que era pior: se a comida, ou o menino sem graça que dizia ser seu dono, ou a saudade de Pedrinho. Então, numa noite, que eles apagaram as luzes, Pitoco, num salto descomunal, fugiu do cativeiro.
   Sob a lua cheia, o grande amiguinho de Pedrinho  alcançou a estrada. Indeciso, ele olhou várias vezes  pros lados. “Ah, São Chiquim! – seu coração, por certo, está pedindo – Vai, São Chiquim de Assis, mostra-lhe o caminho...”.    
    Mostrou? Sim! E Pitoco, ó, abriu a venta.
   Abriu a venta sob a guarda de São Chiquim. Carros e caminhões passam a toda. E os outros animais, a rondar? Lobos, onças, répteis, cachorro do mato... Mas Pitoco não parou.
   Como um cãozinho consegue tanto fôlego, tanta energia? Não se sabe. O que se sabe é que seu coração, por certo, está dizendo: “Vai, São Chiquim de Assis, dê mais força ao Pitoco! Corra Pitoco! Corra mais, mais, mais!”. 
   Seu coração é tão bom que lhe está trazendo lágrimas, só porque Pitoco se deitou ao portão da casa dele e de Pedrinho, já dia claro. E você vê, também, a menina Cidinha, vizinha de Pedrinho, chamar ao portão:
   – Pedrinhô! Ô Pedrinhô!
   Pedrinho e sua mãe saíram aos gritos de Cidinha. Pedrinho ainda disse a ela: “Que doidice é essa, hein Cidinha?”. Que doidice, a da Cidinha? Ele é que não sabia que seu amiguinho estava deitado junto ao portão, muito cansado.
    Pedrinho nem viu que saltou à calçada e tomou Pitoco nos braços. Daí... Bom, você vê o caderno de Pedrinho sobre a mesa, não vê? Vira páginas e lerás a oração que Pedrinho escreveu, durante os dias em que seu amiguinho esteve ausente: “São Chiquinho! Traga Pitoco de volta pra mim”.
   A mãe de Pedrinho, que leu a oração, chorou. E mais: que viu Pedrinho e Pitoco a brincar no quintal, seu poço de lágrimas correu-lhe no rosto. “Ah, que me importa chorar?” – ela disse – “Eu choro, e o que é que tem? Estou nem aí...”.


Ao meu saudoso amiguinho Pitoco, que, por certo, corre e brinca em algum lugar do outro Plano de vida.


11 comentários:

  1. Lindo! Que emoção deve ser reecontrar um bichinho perdido!

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  2. Ah, Márcio, um amiguinho assim desaparecido de repente já causou muito transtorno aqui em casa, pra minha filha já adolescente! Era a Mel. Foi um sufoco por muito tempo, porque ela estava com depressão e a cachorrinha era sua terapia predileta. Ela só melhorou quando depois de algum tempo foi abraçada pela chegada de outra amiguinha: a Sol, que atende também por outros apelidos carinhosos: Futika e Tchulika. É uma mini poodle; só falta falar, mas nem precisa, porque entende tudo que conversamos com ela; perguntamos o que quer e ela nos leva onde está o que deseja; ela chega perto do filtro e "pede" água qdo está com sede... e faz muitas outras coisas! É simplesmente um outro membro da família! Amei seu texto, como sempre! Você está sempre escarafunchando nossa alma, seu moço! Beijos no coração.

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  3. Só os mansos de coração reconhecem a verdadeira amizade e alegria que trazem esses afetuosos bichinhos. É você além do seu amor a eles sabem transmitir isso em historinhas com emoção. Gostei da xará na historinha...rs. Sempre um prazer ler você!

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  4. Olá, Marcio. ainda bem que ele conseguiu fugir! Uma historinha com final feliz... sabe, lembrou-me de um cão nosso que desapareceu (eu era criança); por vários dias, procuramos por ele, até que ele reapareceu com um pedaço de corda amarrado ao pescoço. Fugiu, na certa.

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  5. Seus contos demonstram sua sensibilidade. Há sempre harmonia familiar, conversas lá do interior (minhas velhas conhecidas), sentimentos tão importantes na vida, como esse entre o menino e o cão. Muito fofa. Abraço.

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  6. Q lindo Márcio, vc teve um amiguinho chamado Pitoco? rs com certeza ele corre lá no céu agora, corre sim...
    Eu também tive um amiguinho, que cresceu comigo, o nome dele era AMIGO, e eu tenho saudade dele até hoje...beijos
    Izabel Christina

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  7. Você sempre nos emociona. A sua maneira de narrar prende a atenção facilmente. e, quando terminamos de ler, sempre fica o gostinho de quero mais. Valeu, Márcio! Abraços, Ysolda

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  8. Humano, leve, espontâneo, coeso, escrita fina, enfim. Parabéns intensos!

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  9. Marcio, linda historinha, com final feliz! Beijos

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  10. Doces recordações geralmente estão implícitas num texto infantil. Vc tem o dom de nos encantar com seus escritos! *Pitoco deve ter sido muito, muito feliz contigo... Abraço carinhoso, Cintia

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  11. Hoje as lágrimas vieram-me aos olhos!

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