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sexta-feira, 29 de outubro de 2021

Mentira!

 

De bodoque e bornal, cabelo testa abaixo e olhos da cor da esperança, dei giro pela Vila. Passei na calçada de quem me queria, e eu nem aí. Voltei no rastro, entrei na quadra e na rua seguinte para passar ao alpendre da casa de quem eu queria, e ela nem aí. Passei rente, a rasgar o braço, porque ela estava e estava ao alpendre.

Olhou-me, primeiro para o bodoque e o bornal, enquanto eu queria que ela me visse como caçador pronto para caçar o nosso namoro, e segui. Na praça da igreja, os buritis apinhados de passarinhos, o sacristão e o padre, me viram. O sacristão, que isso… matar passari-nho? Me dá esse bodoque, dou não, é meu, e nos rolamos. Rasguei o beiço dele à unha, e com a mesma arma ele rasgou a mi-nha testa.

O padre nos apartou, me mandou embora, e voltei pela calçada dela. Ao me ver sangrando, e eu queria um ribeiro de sangue no meu rosto, ela levou as mãos à boca — oh! —, e me convidou a entrar, a sentar no seu banco de alpendre. Daí, que pensei ganhar um beijo da minha deusa, ela entrou na casa, veio com tesoura, cortou em pedaços o meu bornal, as gomas, segurou um pauzinho da forquilha, eu noutro, e adeus, bodoque.

Dias depois, a vi à janelinha do expresso, ela a se mudar para a cidade grande. Foi quando meus olhos perderam o verde da esperança, e as minhas esperanças de muita coisa, ó….

Agora, cinquenta anos depois… Mentira! Gritei comigo, ao vê-la pela Internet.