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quarta-feira, 11 de março de 2020

O Entregador de Pão

Mais que a Cartilha Sodré, que a Cachoeira de Paulo Afonso, que a Missa Primeira, a primeira profes-sora… Mais que Papai Noel até, era-me o entregador de pão. Ao quentinho de mamãe, ela me sussurrava que só os galos seresteiros e as estrelas o conheciam. No escuro, à espera dos seus passos na calçada, dos seus toques leves na janela, ao prender a sacola de pão, meu fôlego opresso, meus ouvidos atentos, meus olhos abertos eram maiores que o silêncio que me fazia. E que seus passos se iam, eu, a aspirar o cheiro morno do pão que entrava pela fresta da janela, ficava a imaginá-lo como uma sombra, como um verso lírico de que carecia o luar. Nem mamãe, nem papai me falaram do entregador de pão. Nunca. Hoje, penso que não o fizeram para não ferir o silêncio de que eu era feito.