O velhinho da pipoca viu-os chegar na Praça das Acácias e se sentarem no banco sob uma das acácias dormidas. O homem, grisalho, o saudou cortesmente, seguido pela mesma amabilidade da mulher.
Trajavam tecidos leves em cinza claro; um pouco diferente das roupas do dia a dia. O homem, camiseta larga e calça presa por cordão; a mulher, cabelo rente à nuca, se elegantizava de brincos, pulseiras, e vestia blusa à cintura e saia comprida.
O velhinho, para fruir da melhor sombra, aproximou-se deles com seu carrinho. Sem que intentasse ouvi-los, ouviu a mulher iniciar a conversa, depois de um suspiro:
― Então é esta a praça que tanto falas. Há quanto tempo não vens aqui?
― Há um ano. Estive aqui diinhas antes das águas de março.
― “São as águas de março fechando o verão”, ela cantou o verso de Jobim.
― Linda canção. Mas a mim, águas de março me lembra um caso, disse ele, jogando a perna sobre a outra. Um caso de amor e dor. Esta praça é parte deste caso, porque aqui um homem passava horas a falar com o amor da sua vida. Fala não a tête-à-tête, não sei se você entende.
― Sim, entendo como falar ao telefone.
― Também. Mais comumente pelo computador. Aqui, coisa de quatro anos atrás, ele a viu na tela. Viu-a como se visse uma flor; e ela o sentiu como o seu primeiro amor. Riam-se dos beijos trocados na tela, e ele traçou plano, se pondo à frente dele como um pássaro a cantar na sua janela. Mas um plano, e outro, por conta dos temperos da vida, falhavam; não rimavam com o que lhe palpitava o coração. Aqui, na praça, ele fechava os olhos para ela; ela somente sua, e o mundo somente deles. Um dia, se lhe abriu o estágio acima da esperança: a verdade de se ir para ela já era mais certa que o sol. Antes das águas de março, inundar-se-ia de alegria no colo dela. Porém, o sol da sua estrada falhou, e uma enorme fenda se abriu entre eles, posto que ela tomasse o rumo de outro coração. Daí, o seu grande amor, a se ver sozinho, sem ideia de destino, entregue como um barco perdido, caiu nas águas paradas e gélidas que levam a outra vida: ele foi encontrado, de rosto sobre os braços, nalguma destas mesinhas.
O silêncio que se fez ao seu relato foi tão dormido quanto às acácias. A mulher, comovida, deitou o rosto no seu braço, e os olhos do velhinho das pipocas receberam um pouco das águas de março. Antes de se levantarem e sair, ela, ainda tomada de emoção por aquela história de amor e dor, quis saber:
― Conheceste esse pobre homem?
― Sim. Muito. Esse homem era eu.
Eles se foram. Aos olhos do velhinho da pipoca, conhecido por “O que vê coisas”, esvaíram-se logo adiante, e para nunca mais ali na praça.
hola, bueno Marcio! Mis ojos se llenaron dágua. Es una muy bella historia espiritual. Gracias, amigo! Stell.
ResponderExcluirUma narração perfeita escrita com muita sensibilidade de um doce sentir. Abraços querido Poeta!
ResponderExcluiré....o amor aqui da Terra.. sabe afagar e ferir, com a mesma intensidade
ResponderExcluirlindo Márcio...lindo
Iza
Bom dia Márcio. Uma descrição perfeita das facetas do amor terreno, quando é verdadeiro ultrapassa as barreiras da eternidade, bjsssssssssssss
ResponderExcluirDe uma sensibilidade sem igual. Fico feliz por poder ler mais um conto seu Márcio. Amor e dor, quem não os já sentiu? Muito lindo! Carinho da Cida.
ResponderExcluirOlá Márcio,
ResponderExcluirUm conto lindo e que emociona. Amar demais e sem o retorno sonhado causa dor e marca a alma para além da eternidade.
Abraço.
Olá, Marcio. Linda história... nos lembra de que algumas coisas não são para ser mesmo...
ResponderExcluirEmocionante, como tudo o que você escreve. Um abraço.
ResponderExcluirClaudio Roberto
ResponderExcluirParabéns caro amigo.
Regina Oliveira
ResponderExcluirMarcioBuriti Texto com o melhor, saudades
Jesiel Miranda,
ResponderExcluirCurtiu isso.
Vera del Puente,
ResponderExcluirCurtiu isso.
Lenir Trautmann,
ResponderExcluirCurtiu isso.
Glaucia Jose Lara Gomes,
ResponderExcluirCurtiu isso.
Claudia De Oliveira Alves,
ResponderExcluirCurtiu isso.
Fatima Galdino,
ResponderExcluirCurtiu isso.
Marcio, como seria bom se os sentimentos sempre encontrassem guarida no coração amado, para uma dança eterna! Mas eternas, apenas as lembranças e a saudade. Muito belo! Abraço.
ResponderExcluirVanice Zimerman Ferreira
ResponderExcluirBelo e emociona, parabéns! Imaginei as cenas... Boa noite Márcio, abraço, Van.
Ceiça Lima
ResponderExcluirBoa tarde amigo poeta. MarcioBuriti Texto. Parabéns pelo texto. Abraço.
Parabéns Márcio, pelo conteúdo e pelo esmero.....abraços.
ResponderExcluirBoa noite meu amigo.
ResponderExcluirQue lindo esse conto... É, por vezes o universo parece não conspirar a favor mesmo...
Senti como se fizesse parte da cena, a praça, os pombos, o cheiro da manteiga esquentando pra pipoca... Tudo tão lindo, amei, parabéns!
Se cuida, fica bem... Um beijo, lu.
Nossa Marcio, excelente, me emocionei e o final foi surpreendente, parabéns abraços Luconi
ResponderExcluirLu Mansanaris
ResponderExcluirÉ incrível a tua forma de escrever... Sinto-me parte da cena, muito intenso, amei, parabéns! Um beijo meu amigo, se cuida...
Mariana Oliveira
ResponderExcluirLindo texto!! Parabéns Pai MarcioBuriti Texto!
Um conto de primeira grandeza. O leitor ve a cena,Conceição Gones,
ResponderExcluirAcho linda a tua sensibilidade a transbordar em teu imenso dom!
ResponderExcluirBeijocas e linda semana pra vc!
Rafael Borges,
ResponderExcluirCurtiu isso.
Ana Soares
ResponderExcluirlindo, como tudo que escreves!
Conto de uma narrativa perfeita . Vive-se e imagina-se detalhadamente cada canto da praça e sonha-se com aquele amor tão especial. Fictício ? Real? Platônico? O autor é capaz de sabê-lo. Parabéns, querido Márcio!
ResponderExcluirSensibilidade fluindo em cada palavra, encantando-nos a alma, povoando nossos sonhos de cenários perfeitos, personagens de mãos dadas com nosso coração e circunstâncias perfumadas de ternura! Belíssimo, como sempre, querido encantador de palavras!
ResponderExcluirMuito bom ler-te e reler-te, aprendo muito com vc! Obrigada! Abç, Cintia
ResponderExcluirSob as acácias, o vai e vem das águas de outros marços... Marcio. Assim com essa delicadeza de contar e fazer a gente pensar no que foi que aconteceu. De tocar fundo.
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